Uns, com os olhos postos no passado,
Vêem o que não vêem: outros, fitos
Os mesmos olhos no futuro, vêem
O que não pode ver-se. 

Falácia. Enleamo-nos nela. E somos cada vez mais tristes.

Por que tão longe ir pôr o que está perto —
A segurança nossa? Este é o dia,
Esta é a hora, este o momento, isto
É quem somos, e é tudo. 

Qual o tempo em que rimos sem cessar? Existiu esse tempo? O que virá de tão magistral que nos impede de erguer os braços? De aplaudir?... De beijar? O que virá que nada permite a nossa atenção agora? É Cristo que regressará amanha?

Perene flui a interminável hora
Que nos confessa nulos. No mesmo hausto
Em que vivemos, morreremos. 

Longo são os meses em que há dias que se estendem além do tédio. Até se chegar ao inadiável dia, como se nada fosse, em que com a perna cruzada se diz:

 - O ano passou a correr.

Amanhã é novo dia, Colhe o dia, porque és ele.


Poema - Colhe o Dia, porque És ele, por Ricardo Reis
Fotografia por  Paulo Ferreira



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